Aristóteles admite que as matemáticas consideram seu objeto à parte
do movimento e da matéria, como se fossem separados. Mas Aristóteles
não mais admite que essa separação continue a ser adequada para as
ciências naturais. Assim, por menor que seja o aspecto natural
sob o qual um objeto é considerado por uma ciência, tal ciência não mais
pode proceder unilateralmente conforme à separação efetuada nas
matemáticas. A ótica, por exemplo, se interessa por conhecer as
propriedades do corpo natural enquanto capaz de refletir a luz: é isso que ela toma como explanandum, e, portanto, é esse seu gênero subjacente, que lhe fornece não apenas definições primeiras,
como também os fatos a seres explicados, os quais, uma vez explicados,
hão de figurar nas conclusões das demonstrações. No entanto, para
explicar as propriedades do corpo natural enquanto capaz de refletir a luz, a ótica usa princípios matemáticos:
conclusões provadas pela geometria ou princípios geométricos hão de
servir como premissas e princípios para explicar por que o corpo
natural, enquanto algo contínuo (submetido à “regras da
geometria”), reflete a luz de tal e tal maneira. É isso que Aristóteles
quer dizer quando diz que a ótica “estuda a linha matemática, não
enquanto linha matemática, mas enquanto linha natural”: a ótica não se
interessa em explicar as propriedades que a linha matemática tem em si
mesma; a ótica recebe, de uma ciência superior destinada a tratar
apropriadamente desse assunto (a geometria), proposições
concernentes às linhas matemáticas, as quais, sendo premissas ou
conclusões da ciência superior, serão agora aplicadas como premissas
para explicar o comportamento das linhas contidas em corpos naturais. De
igual modo, a astronomia se interessa por conhecer as propriedades de certos corpos naturais (os corpos celestes) enquanto capazes de se movimentar de certo modo: é isso que ela assume como explanandum.
Assim, os corpos celestes enquanto capazes de se movimentar constituem o
gênero subjacente da astronomia, o qual lhe fornece não apenas
princípios (definições primeiras), mas também os fatos a serem
explicados, os quais, uma vez explicados, hão de figurar nas conclusões
das demonstrações dessa ciência. No entanto, para explicar as
propriedades do corpo celeste enquanto capaz de se movimentar de certo modo, a astronomia se vale de princípios matemáticos e até mesmo de métodos matemáticos (cf. De Caelo, 297ᵃ 2-6). Assim, conclusões provadas pela geometria hão de servir como princípios para explicar por que os corpos celestes, como quantidade contínua capaz de se locomover,
se configuram em tais e tais trajetórias. Podemos dizer que também a
astronomia “estuda a linha matemática, não enquanto linha matemática,
mas enquanto linha natural (celeste)”: a astronomia tampouco se
interessa em explicar as propriedades que a linha matemática tem em si
mesma; ela igualmente recebe da geometria proposições sobre linhas matemáticas que são usadas como premissas para explicar o comportamento de linhas naturais, isto é, das linhas descritas pelas trajetórias dos movimentos dos corpos celestes.